Psy

"Só algumas pessoas escolhidas pela fatalidade do acaso provaram da liberdade esquiva e delicada da vida" "Sou como você me vê. Posso ser leve como uma brisa, ou forte como uma ventania, depende de quando e como você me vê passar" "Clarice Lispector"

2.1.08


Voto

Noite tépida, perfume de ameixeiras,
daí a minha amada um sonho delicioso.
Fazei com que ela fique impaciente de rever-me e que,
de madrugada, venha bater à minha porta.
Perfume de ameixeiras, luar, noite tépida,
saberei pelos seus beijos se me ouvistes.
A Flauta de Jade


Relutância Feminina

Fora da janela de gaze azul, tudo é silêncio e solidão.
Ajoelhado diante de meu leito, ele me acaricia com ardor.
Amaldiçôo esse coração ingrato, mas inclino-me para ele.
Embora minhas palavras sejam furiosas,
com relutância, recuso-o;
com relutância, aceito-o.

Os Jogos das Nuvens e da Chuva


O Primeiro Beijo

Ela estava de pé, bem perto de mim.
Olhei-a até a alma, e minhas mãos agarraram seus dois pulsos.
Cerrando os olhos, ofereceu-me sua face.
Contenta-se, acaso, o viajante sedento com frutos ,
quando uma fonte está próxima?
No fim, nossos lábios se uniram.
E todo seu corpo, contra o meu,
nada mais era do que uma boca.

O Jardim das Carícias


Mulher é sempre mulher

Se a jovem não nos quer, tomaremos a mãe,
e daremos alegrias a todas.
Que os seios sejam pequenos como limões,
ou enormes como abóboras, ou enrugados como pele de elefante,
ou moles como arroz cozido, mulher é sempre mulher.
E faremos o amor com todas.

As Mil e Uma Noites


Solidão

Sozinha, receio olhar as manifestações da primavera.
As flores dos pessegueiros são vermelhas.
Os salgueiros se cobrem de folhas novas.
Não gosto do vento do Leste porque não consegue dissipar minha tristeza.
As andorinhas gorjeiam duas a duas,
os rouxinóis esvoaçam dois a dois,
os jovens brincam e provocam-se com palavras de amor.
Sou menos feliz que todos eles, porque estou só.

Os Jogos das Nuvens e da Chuva



Uma Mulher Só

Só, no seu quarto, uma jovem borda flores de seda.
De repente, ouve uma flauta distante. Estremece.
Crê que um jovem lhe fala de amor.
Através da janela, a sombra de uma folha
de laranjeira vem pôr-se sobre seus joelhos.
Fecha os olhos. Crê que uma mão lhe rasga o vestido.


Amo-o como amo minha boca.
O dia todo, minha boca é minha felicidade.
O dia todo, mastigo o bétele, ou como iguarias,
ou fumo tabaco, ou rio, ou canto.
Somente de noite, minha boca não me serve para nada.
Mas agora, ela me dá mais alegria do que de dia pois,
a noite toda, bebo os lábios e a pele e o cabelo daquele que me ama.


Irei, encontrarei um pretexto para estar fora até o crepúsculo.
Irei.
E como preciso de tempo para degustar a minha felicidade,
tomarei o longo caminho que passa pela fonte,
e direi a minhas companheiras que estou indo ver se os campos
de meu pai sofreram com o temporal.
Ó amor vitorioso, irei!
Irei, ó coração selvagem!


Às vezes, és tão desolada, ó noite.
Às vezes, és tão lindo, ó dia.
E ás vezes como és suave, ó noite, e como és cruciante, ó dia!
Se ele pretende mesmo nunca mais voltar,
pudésseis ambos deixarem de existir!


Escrevo esta carta pela claridade da lua.
Meus amigos me convidaram, mas preferi ficar neste quarto cheio de ti.
Estou ainda chorando.
Olhei para o jardim, e vi a sombra de uma folha de bambu
escrever uma palavra ilegível na areia azul.
Talvez fosse teu nome.


Meu sangue o chama. Mas ele não vem.
Esta aurora nunca se levanta para mim.
Ó lua, serão teus raios frígidos que devoram meus seios?
A brisa carregada da fragrância dos jardins queima-me terrivelmente.
Não sou mais o que era. Vou morrer.



Sete Vezes ao Dia

Não há dúvida de que uma mulher que deseja enganar o marido sempre o consegue.
Nada pode detê-la.
O próprio Deus disse que o homem sente paixão três vezes ao dia, e a mulher, sete vezes ao dia.
Que mulher não está sempre pronta a oferecer-se quando o desejo se apodera dela,
seja qual for o lugar e a ocasião?

O Pavilhão dos Prazeres Proibidos


Sarcasmo

Tu, a altiva, tu, cujo desdém foi mais amargo que o aloés,
vê como jaz no pó tua coroa de orgulho.
Um jovem cavalheiro soube seduzir-te,
partindo logo para outros amores.
E permaneceis aí, sem prestígio e sem segredo,
como uma porta cuja fechadura foi violada.

Cantos da Caravana


Um Homem Livre

Estou livre de um velho amor.
Todas as mulheres são belas agora.
Minha camisa é nova. O sol brilha.
Estou na rua.
A paz está em mim.
As pessoas estão bem.
Estou bem.

Orhan Veli



A Companheira

A bem-amada te deixou.
Tens que aprender a viver sem ela – ouvir, tocar, ver e sentir,
provar a amargura do nada.
A bem amada te deixou, pois a ventura não te pertence.
Filho de poeta ou filho de rei,
a dor é tua companheira constante.
O Pavilhão dos Prazeres Proibidos



Uma Noite de Amor
Tão logo a noite cobre o ouro do crepúsculo, ela começa a dançar no café Mouro.
Um braseiro olha com seu olho avermelhado, como olham todos os homens, seu belo rosto feito promessa e sua dança de bint ard el-hob, isto é, filha do país do amor.
E são inúmeros os que vêm dos palmeirais mais longínguos sonhar diante de uma minúscula xícara de chá ou de café preto só para admirá-la, ela, a sultana desnuda, a que não tem igual.

Sim, é fato que o desejo, para conhecê-la melhor, arrancou o véu que ela usava nos seus primeiros passos de vida de mulher...
Desde então, nada mais lhe pertence, de si mesma.
Toda ela pertence a esse inconstante que toma o nome de todos os homens e que roda em volta em volta de sua casa todas as noites.
Quando, cansada de lhe obedecer, procura nas horas de hoje o sabor puro das horas de antanho, sente mãos e mais mãos, cobiçosas, rudes, imperiosas precipitarem-se sobre sua túnica...
E ela nada mais é do que um pobre beijo roubado.


Sonho
Entre todas as sultanas, há uma que ainda te falta,
uma que gostarias de possuir, mas que nunca terás,
pois seria necessário cosê-la pedaço por pedaço,
o pedaço mais bonito do corpo de cada uma de todas as sultanas.
Até poderia realizar esse milagre.
Mas sabes que, para ele, só conta a alma.
Então, unicamente o sonho é capaz de te dar por um instante fugaz.
Vê:
Ela tem os olhos de promessa de Yamina, a carinhosa.
Os lábios de desejo de Khadra, a gulosa.
Os seios de volúpia de Dudu, a insaciável.
Os lombos ardentes na sua flexibilidade de Aicha, a dançarina.
Os pés de galope ligeiro de Sofré, a nômade.
A voz de alegria de Laila, a cantora.
E os joelhos de súplica de Mirian, a crente...
Mas eis que respiras mais forte, e, a teu sopro, os pequenos pedaços,
Tomados a cada uma das tuas amadas, retornam para seus lugares.
E a sultana das sultanas volta a ser apenas uma miragem.


Grãos de Arroz
Que faz o pássaro quando o grão de arroz que se prepara para bicar é removido pelo vento da borda da janela?
Põe-se a procurar outro grão, pois os celeiros cestão cheios.
Deixa, pois, meu amigo, de te preocupar e sobrecarregar a testa.
Não são as mulheres quase tão inúmeras quanto o são os grãos de arroz?

O Pavilhão dos Prazeres Proibidos


O Broto
Terna donzela, rama nova, face de maçã.
Que rosas, que amendoeiras em flor,
que jardim úmido e fresco viram-te nascer uma manhã,
há quinze primaveras, botão fechado?

Cantos da Caravana


Canto do Travesseiro

A noite, quando não durmo,
o travesseiro e eu conversamos.
Escuta-me, pequeno travesseiro.
Amo-o! Amo-o!

Dodiotzu


Uma Noite de Amor

Ó céu, não espero que te tornes generoso e bom para comigo.
Tudo o que te peço é que detenhas teu curso e pares,
para que gozes esta noite em sua companhia.
Na minha modesta casa, a lua cheia chegou com ela.
Não preciso de nenhum raio de sol.
Ó sol, fica onde estás e não te levantes.

Faizy


Um Homem Só

Ela não vive mais, e as flores continuam a nascer.
Ó morte, agora que possuis esse corpo maravilhoso
como podes encontrar tempo para continuar a matar?
Ó perfume de amor e sorrisos de amor,
ó glória do sol e esplendor da noite estrelada,
postos num prato da balança
quando no outro prato está a morte
não mais satisfazeis meu desejo!


Numa noite de lua, suspendi à sua porta uma grinalda
de flores de macieira, depois toquei no meu alaúde
uma melodia de amor.
No dia seguinte, encontrei-a.
Cravos vermelhos, colhidos no jardim de meu vizinho,
Enfeitavam seu vestido.
Tranquei-me dentro de minha casa,
quebrei meu alaúde e chorei.


Quando Te Aperto

Quando te aperto nos meus braços, é em mim que pensas ou no amor?
“Minha amada olhou-me em silêncio, e suas pestanas batiam como asas de borboleta.”
Depois respondeu com sua doce voz:
“Quando me apertas nos teus braços, não penso.”
O Pavilhão dos Prazeres Proibidos


O Beijo à Noite

Com as mãos, tomei tua cabeça como quem toma
uma âncora e me servi do néctar do amor.
Quem teria pensado que uma âncora tão pequena contivesse tanto licor?
A aurora já despontava no céu quando nossas bocas se separaram.
O Jardim das Carícias


Garota Jovem e Barco Novo

Se perderes a razão, faze de mim o que quiseres.
Pois, sem reserva nem remorso, doei-te tudo o que sou.
Garota jovem e barco novo, quem não quer ver e usar?
Mesmo nas noites em que durmo só, alinhando os travesseiros,
finjo que um deles é meu amante e tomo-o para dormir.

Do Folclore Japonês, pesquisa de Georges Bonneau


Ngo Gay Ngy

Como a lua no céu azul,
estou sozinha no meu quarto.
Apaguei a lâmpada.
Choro.
Choro porque estás longe de mim
e nunca saberás quanto te amo.

A flauta de Jade


Um ou Dois?

Uma flor sobre seu talo.
Dois homens querendo colhê-la.
Para que lado pender?
Hesito...
Enquanto houver maridos que nos desgostam do casamento,
haverá homens que, sem casamento, amaremos cada vez mais.
Canta, menina de dezessete anos, canta até perder o fôlego,
canta até fazer abrir o lótus, o lótus de teu coração!
Dormis a dois? Dormes só?
Perguntemos ao travesseiro.
O travesseiro respondeu que dormis a dois.

Do Folclore Japonês, pesquisa de Georges Bonneau


Lembranças

Naquela noite, nevava no jardim Liang.
Eu tinha frio e contemplava as árvores por baixo
das quais costumava esperar-te.
Mas tu nada percebias.
Nevava, nevava sobre nosso passado.

A Flauta de Jade


A Inconstância Aceita

Disseste-me:
“Nenhum outro homem jamais tocou em mim. Desde há meses, vivo no deserto do coração.
Todas as noites, quando o rouxinol canta ao levantar da lua,
meus seios se enchem de langor, uma gota de cristal treme nos meus cílios.”

Disseste-me também:
“Quando estivermos separados, meu pensamento nunca te abandonará.
Meus lábios procurarão, sem descanso, no vácuo do espaço, a forma dos teus.”
E, pérola límpida, acreditei no que dizias.
Pois teus olhos têm sobre mim o efeito que o olhar da serpente tem sobre o pássaro.
E tomavas, para dizer essas coisas, um acento tão ternamente melancólico que me julguei, na verdade, o único habitante de teus sonhos.

Mas, um dia, estando, sem que o soubesses, atrás do biombo de laca, teu riso soou bem alto, proclamando uma felicidade recente.
De onde vinhas, pérola?
Não quis sabê-lo.
Que me importava que outro tivesse obtido o que iria obter por minha vez?
Não tem a mulher tantas sinceridades diferentes quantos o ano tem dias?
Quando aspiras o perfume de uma flor, afliges-te se outros a aspiraram antes de ti?

O Pavilhão dos Prazeres Proibidos


Após a Devastação

Balbucias de vergonha e tens medo de erguer a cabeça.
Contentas-te em esconder o rosto sob o travesseiro.
De teu cabelo, feito de nuvem, caem teus alfinetes de ouro,
e esse cabelo desarrumado realça mais a tua beleza.
Desabotôo teu vestido. Desfaço o nó do teu cinto.
Um perfume de almíscar se espalha na escuridão do quarto.
Cruel, procuras afastar-te.
Aperto contra mim esse corpo cheiroso e tépido, de flexível beleza.
A primavera chega. As flores tomam cor.
Teu talho maleável agita-se ao meu ritmo.
O botão de tua flor abre-se por metade.
As gotas de meu orvalho desabrocham tua peônia.
Uma primeira libação começa a entorpecer-me.
Sou um peixe que se agita na água.
Sou uma borboleta que recolhe o perfume das flores.
Recuas um passo para te aproximar de novo.
Em mim, lutam a surpresa e o amor.
Beijo teus lábios vermelhos e tuas faces odorantes.
Imobilizo-te contra meu coração e minhas estranhas,
a ti cuja pureza manchei.

Os Jogos das Nuvens e da Chuva


Duas Pessoas
Meu amante, meu querido tolo, amassemos a argila e modelemos duas pessoas:
uma serás tu, a outra serei eu.
Serão iguais, e estarão deitadas num leito.
Depois, quebrá-las-emos e as amassaremos de novo com água,
e modelaremos outra vez duas pessoas:
uma como tu, outra como eu.
E eu habitarei teu corpo,
e tu habitarás o meu.

Os Jogos das Nuvens e da Chuva


Uma Vida Passa Tão Depressa
Se a esposa que te deram tem rosto triste e corpo magro,
Por que te queixares, meu amigo?
Uma vida passa tão depressa!

Se a mulher que almeja desmaia nos braços de outro,
Resigna-te e toma outra.
Uma vida passa tão depressa!

Se as delícias que mais desejas estão cada dia mais distantes,
Chora e depois ri de ti mesmo.
Uma vida passa tão depressa!

Se achares que nunca mais amarás, estás falando como um louco.
Corre a amar outra vez.
Uma vida passa tão depressa!

O Pavilhão dos Prazeres Proibidos


Canção Triste
Repetias-me:
“Envelhecermos juntos. Ao mesmo tempo que o meu, teu cabelo se tornará branco como a neve das montanhas, como a lua do verão.”

Hoje, senhor meu, soube que amas outra mulher e venho,
desesperada, dizer-te adeus.

Pela última vez, vertamos vinho em nossas taças.
Pela última vez, canta para mim aquela canção
que fala de um pássaro morto sob a neve.
Depois, partirei num barco sobre o rio Yu-keu,
cujas águas se dividem para correr na direção do leste e do oeste.

Por que choras, moça que se casa?
Talvez teu marido seja um homem fiel que te repita com sinceridade:
“Envelheceremos juntos.”

A Flauta de Jade


No Além, o homem terá que responder por aquilo que, sendo gostoso ao paladar, ele o olhou com desejo, mas não o comeu.
(T.J. Kiddushin)


Multiplica teus pecados ao possível, pois o Senhor que te julgará é clemente.
Quando comparecerás diante Dele, morderás os dedos de arrependimento por todos os prazeres que terás deixado de aproveitar por medo do inferno.

(Abu-Nauas)



Texto extraído do livro Os Mais Belos Pensamentos de Todos os Tempos, Mansour Challita
This image is copyright © by Daniel F. Gerhartz


2 Comments:

Blogger belakbrilha diz...

Não existia melhor maneira para começar o ano!
...beleza nas palavras
...beleza nas imagens

BELO!!!!

sem palavras...

beijo desta amiga distante!

11:53 AM  
Blogger LUIS MILHANO (Lumife) diz...

Grato pela visita ao "Beja". Após uma ausência normal nesta data voltei e um dos blogs que estou visitando é o Mirada Secreta que ainda não tive oportunidade de percorrer todo.
Encantou-me o modo de "postar" seus textos e imagens. Vou continuar neste deslumbramento.

Tudo de bom em 2008.

12:51 PM  

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