Psy

"Só algumas pessoas escolhidas pela fatalidade do acaso provaram da liberdade esquiva e delicada da vida" "Sou como você me vê. Posso ser leve como uma brisa, ou forte como uma ventania, depende de quando e como você me vê passar" "Clarice Lispector"

30.8.06

A História de Uma Folha


Era uma vez uma Folha, que crescera muito. A parte intermediária era larga e forte, as cinco pontas eram firmes e afiladas.
Surgira na primavera, como um pequeno broto em um galho grande, perto do topo de uma árvore alta.
A Folha estava cercada por centenas de outras folhas, iguais a ela. Ou, pelo menos, assim parecia. Mas não demorou muito para que descobrisse que não havia duas folhas iguais, apesar de estarem na mesma árvore.Alfredo era a folha mais próxima. Mário era a folha à sua direita. Clara era a linda folha por cima. Todos haviam crescido juntos.
Aprenderam a dançar à brisa da primavera, a se esquentar indolentemente ao sol do verão, a se lavar na chuva fresca.
Mas Daniel era seu melhor amigo. Era a folha maior no galho e parecia que estava lá antes de qualquer outra.
A Folha achava que Daniel era também o mais sábio.
Foi Daniel quem lhe contou que eram parte de uma árvore.
Foi Daniel quem explicou que estavam crescendo num parque público.
Foi Daniel quem revelou que a árvore tinha raízes fortes, escondidas na terra lá embaixo.
Foi Daniel quem falou dos passarinhos que vinham pousar no galho e cantar pela manhã.
Foi Daniel quem contou sobre o sol, a lua, as estrelas e as estações.
A primavera passou. E o verão também.
Fred adorava ser uma folha. Amava o seu galho, os amigos, o seu lugar bem alto no céu, o vento que o sacudia, os raios do sol que o esquentavam, a lua que o cobria de sombras suaves.


O verão fora excepcionalmente ameno. Os dias quentes e compridos eram agradáveis, as noites suaves eram serenas e povoadas por sonhos.
Muitas pessoas foram ao parque naquele verão. E sentavam sob as árvores.
Daniel contou à Folha que proporcionar sombra era um dos propósitos das árvores.
- O que é um propósito? - perguntou a Folha.
- Um razão para existir - respondeu Daniel - tornar as coisas mais agradáveis para os outros é uma razão para existir. Proporcionar sombra aos velhinhos que procuram escapar do calor de suas casas é uma razão para existir.
A Folha tinha um encanto todo especial pelos velhinhos. Sentavam em silêncio na relva fresca, mal se mexiam. E quando conversavam eram aos sussurros, sobre os tempos passados.
As crianças também eram divertidas, embora às vezes abrissem buracos na casa da árvore ou esculpissem seus nomes. Mesmo assim, era divertido observar as crianças.
Mas o verão da Folha não demorou a passar.
E chegou ao fim numa noite de outubro. A Folha nunca sentira tanto frio. Todas as outras folhas estremeceram com o frio. Ficaram todas cobertas por uma camada fina de branco, que num instante se derreteu e deixou-as encharcadas de orvalho, faiscando ao sol..
Mais uma vez, foi Daniel quem explicou que haviam experimentado a primeira geada, o sinal que era outono e que o inverno viria em breve.
Quase que imediatamente, toda a árvore, mais do que isso, todo o parque, se transformou num esplendor de cores. Quase não restava qualquer folha verde.


Alfredo se tornou um amarelo intenso. Mário adquiriu um laranja brilhante. Clara virou um vermelho ardente. Daniel estava púrpura. E a Folha ficou vermelha, dourada e azul. Todos estavam lindos.
A Folha e seus amigos converteram a árvore num arco-íris.
- Por que ficamos com cores diferentes, se estamos na mesma árvore? - perguntou a Folha.
- Cada um de nós é diferente. Tivemos experiências diferentes. Recebemos o sol de maneira diferente. Projetamos a sombra de maneira diferente. Por que não teríamos cores diferentes?
Foi Daniel, como sempre, quem falou. E Daniel contou ainda que aquela estação maravilhosa se chamava outono.
Um dia aconteceu uma coisa estranha. A mesma brisa que, no passado, os fazia dançar começou a empurrar e puxar suas hastes, quase como se estivesse zangada.
Isso fez com que algumas folhas fossem arrancadas de seus galhos e levadas pela brisa, reviradas pelo ar, antes de caírem suavemente ao solo.
Todas as folhas ficaram assustadas.
- O que está acontecendo? - perguntaram umas às outras, aos sussurros.
- É isso que acontece no outono - explicou Daniel - é o momento em que as folhas mudam de casa. Algumas pessoas chamam isso de morrer.
- E todos nós vamos morrer? - perguntou Folha
- Vamos sim - respondeu Daniel - tudo morre. Grande ou pequeno, fraco ou forte, tudo morre. Primeiro cumprimos a nossa missão. Experimentamos o sol e a lua, o vento e a chuva. Aprendemos a dançar e a rir. E, depois morremos.


- Eu não vou morrer! - exclamou Folha, com determinação - você vai, Daniel?
- Vou sim... Quando chegar meu momento.
- E quando será isso?
- Ninguém sabe com certeza - respondeu Daniel.
A Folha notou que as outras folhas continuavam a cair. E pensou:
"Deve ser o momento delas."
Ela viu que algumas folhas reagiam ao vento, outras simplesmente se entregavam e caíam suavemente.
Não demorou muito para que a árvore estivesse quase despida. - Tenho medo de morrer - disse Folha a Daniel - não sei o que tem lá embaixo.
- Todos temos medo do que não conhecemos. Isso é natural - disse Daniel para animá-la - mas você não teve medo quando a primavera se transformou em verão. E também não teve medo quando o verão se transformou em outono. Eram mudanças naturais. Por que deveria estar com medo da estação da morte?
- A árvore também morre? - perguntou Folha.
- Algum dia vai morrer. Mas há uma coisa que é mais forte do que a árvore. É a vida. Dura eternamente e somos todos uma parte da vida.
- Para onde vamos quando morrermos?
- Ninguém sabe com certeza... É o grande mistério.
- Voltaremos na primavera?
- Talvez não, mas a vida voltará.
- Então qual é a razão para tudo isso? - insistiu Folha - Por que viemos para cá, se no fim teríamos de cair e morrer?
Daniel respondeu no seu jeito calmo de sempre:
- Pelo sol e pela lua. Pelos tempos felizes que passamos juntos. Pela sombra, pelos velhinhos, pelas crianças. Pelas cores do outono, pelas estações. Não é razão suficiente?


Ao final daquela tarde, na claridade dourada do crepúsculo, Daniel se foi. E caiu a flutuar. Parecia sorrir enquanto caía.
- Adeus por enquanto. disse ele à Folha.
E depois, Folha ficou sozinha, a única folha que restava no galho. A primeira neve caiu na manhã seguinte. Era macia, branca e suave. Mas era muito fria. Quase não houve sol naquele dia... E foi um dia muito curto.
A Folha se descobriu a perder a cor, a ficar cada vez mais frágil. Havia sempre frio e a neve passava sobre ela. E quando amanheceu veio vento que arrancou a Folha de seu galho.
Não doeu. Ela sentiu que flutuava no ar, muito serena. E, enquanto caía, ela viu a árvore inteira pela primeira vez. Como era forte e firme! Teve a certeza de que a árvore viveria por muito tempo, compreendeu que fora parte de sua vida. E isso deixou-a orgulhosa. A Folha pousou num monte de neve. Estava macio, até mesmo aconchegante. Naquela nova posição, Folha estava mais confortável do que jamais se sentira.
Ela fechou os olhos e adormeceu. Não sabia que a primavera se seguiria ao inverno, que a neve se derreteria e viraria água. Não sabia que a folha que fora, seca e aparentemente inútil, se juntaria com a água e serviria para tornar a árvore mais forte. E, principalmente, não sabia que ali, na árvore e no solo, já havia planos para novas folhas de primavera
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Leo Buscaglia



Imagens: Kinkade
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Amizade


As pessoas passam por acaso em nossas vidas,
Mas não é por acaso que permanecem.

Não são as grandes ações que conquistam a amizade
Essas são esperadas e possíveis.
O que cativa a gente e faz nascer o sentimento de querer bem
São as atitudes inesperadas e necessárias.

Para ser amigo, não é preciso muita coisa...
Basta estar disposto a se deixar conhecer
E ter a vontade de “ver” a outra pessoa além do que a julgamos.
(Homenagem ao Falcão Peregrino)

29.8.06

Fragmentos

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"Não sei, deixo rolar. Vou olhar os caminhos, o que tiver mais coração, eu sigo."
(Caio Fernando Abreu)

"É difícil lutar com o coração, porque se paga com a alma."
(Alexandre Costa)

"Aprendi com a primavera a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira."
(Cecília Meireles)




Fim

Momento ou ponto em que se interrompe um fenômeno, período ou ação; limite; epílogo, conclusão; última instância (de algo), raia, ponto final; cessação, encerramento, término (Dic. Houaiss).


Poema da Mulher

ouvindo

Eu colhi a tua flor, ó Mundo!

Cheguei-a muito ao meu coração: e o seu espinho feriu-me.
Quando o dia declinou, sombrio, a flor murchou: mas a dor ficou.
Muitas flores terás ainda, perfumadas e gloriosas, ó Mundo!
Mas para mim já passou a hora de colher flores. E já não tenho a minha rosa, na noite profunda que vem: tenho apenas a dor que ficou.



Ó mulher, não és apenas a obra-prima de
Deus,
mas também a dos homens. Estes te enfeitam com a beleza do seu coração.
Os poetas tecem os teus véus com os fios de ouro da sua fantasia; os pintores imortalizam a forma de teu corpo.
Dá suas pérolas o mar, as minas dão seu ouro, dão suas flores os jardins estivais - para que sejas mais linda e mais preciosa.
O desejo do homem coroa de glória tua mocidade.
És metade mulher, metade sonho.



Os poetas tecem os teus véus com
os fios de ouro da sua fantasia;
os pintores imortalizam a forma de teu corpo.
Dá suas pérolas o mar, as minas dão seu ouro,
dão suas flores os jardins estivais - para que
sejas mais linda e mais preciosa.
O desejo do homem coroa de glória tua mocidade.
És metade mulher, metade sonho.

R.N.Tagore




Imagem: W.Bouguereau

Poema da Despedida

É hora de partir, meus irmãos, minhas irmãs
Eu já devolvi as chaves da minha porta
E desisto de qualquer direito à minha casa.
Fomos vizinhos durante muito tempo
E recebi mais do que pude dar.
Agora vai raiando o dia
E a lâmpada que iluminava o meu canto escuro
Apagou-se.
Veio a intimação e estou pronto para a minha jornada.
Não indaguem sobre o que levo comigo.
Sigo de mãos vazias e o coração confiante.
Rabindranath Tagore.


Os Presentes


OITO BONS PRESENTES QUE NÃO CUSTAM UM CENTAVO.


O PRESENTE ESCUTAR...
Mas você deve realmente escutar. Sem interrupção, sem distração, sem planejar
sua resposta. Apenas escutar.

O PRESENTE AFEIÇÃO...
Seja generoso com abraços, beijos, tapinhas nas costas e aperto de mãos. Deixe
estas pequenas ações demonstrarem o amor que você tem por família e amigos.

O PRESENTE SORRISO....
Junte alguns desenhos. Compartilhe artigos e histórias engraçadas. Seu presente
será dizer, "Eu adoro rir com você.

O PRESENTE BILHETINHO...
Pode ser um simples bilhete de Muito obrigado por sua ajuda; ou um soneto
completo. Um breve bilhete escrito à mão pode ser lembrado pelo resto da vida, e
pode mesmo mudar uma vida.

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O PRESENTE ELOGIO...
Um simples e sincero,
Você ficou muito bem de vermelho,
Você fez um super trabalho" ou
Que comida maravilhosa,
faz o dia de alguém melhor.

O PRESENTE FAVOR...
Todo dia, faça algo amável.

O PRESENTE SOLIDÃO...
Tem momentos em que nós não queremos nada mais do que ficar sozinhos. Seja
sensível à esses momentos e dê o presente da solidão ao outro.

O PRESENTE DISPOSIÇÃO...
A maneira mais fácil de sentir-se bem é colocar-se à disposição de alguém, e isso não é difícil de ser feito.

Desconheço o autor.


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Trem da vida

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Um amigo falou-me de um livro que comparava a vida a uma viagem de trem. Uma comparação extremamente interessante,quando bem interpretada. Isso mesmo. A vida não passa de uma viagem de trem, cheia de embarques e desembarques, alguns acidentes, surpresas agradáveis em alguns embarques e grandes tristezas em outros.


Quando nascemos, entramos nesse trem e nos deparamos com algumas pessoas que, julgamos, estarão sempre nessa viagem conosco: nossos pais. Infelizmente, isso não é verdade; em alguma estação eles descerão e nos deixarão órfãos de seu carinho, amizade e companhia insubstituível. Mas isso não impede que, durante a viagem, pessoas interessantes, e que virão a ser super especiais para nós, embarquem. Chegam nossos irmãos, amigos e amores maravilhosos.


Muitas pessoas tomam esse trem apenas a passeio. Outros encontrarão nessa viagem muitas tristezas. Ainda outros circularão pelo trem, prontos a ajudar a quem precisa. Muitos descem e deixam saudades eternas, outros tantos passam por ele de uma forma que, quando desocupam seu acento, ninguém nem sequer percebe.


Curioso é constatar que alguns passageiros, que nos são tão caros, acomodam-se em vagões diferentes dos nossos; assim somos obrigados a fazer esse trajeto separados deles, o que não impede, é claro, que durante a viagem atravessemos, com grande dificuldade, nosso vagão e cheguemos até eles. Só que infelizmente jamais poderemos sentar ao seu lado, pois já terá alguém ocupando aquele lugar. Não importa. É assim a viagem - cheia de atropelos, sonhos, fantasias, esperas, despedidas. Porém, jamais, retornos.


Façamos essa viagem da melhor maneira possível, tentando nos relacionar bem com todos os passageiros, procurando, em cada um deles, o que tiverem de melhor, lembrando, sempre, que em algum momento do trajeto eles poderão fraquejar, e provavelmente precisaremos entender isso, porque nós também fraquejaremos muitas vezes e, com certeza, haverá alguém que nos entenderá.


Amigos, façamos com que a nossa estada, nesse trem, seja tranqüila, que tenha valido à pena e que, quando chegar a hora de desembarcarmos, o nosso lugar vazio traga saudades e boas recordações para aqueles que prosseguirem

Silvana Duboc


28.8.06

Dançando com o Espantalho

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“... Um dos motivos de nossas frustrações, homens e mulheres, é vivermos numa cultura que idolatra a juventude e endeusa a forma física além de qualquer sensatez.
Se maturidade é fruto da mocidade e velhice é resultado da maturidade, viver é ir tecendo naturalmente a trama da existência. Processo tão enganosamente trivial para aquele que o vive, tão singular para quem o observa. Tão insignificante no contexto da história humana.
Seguindo este fluxo, vestidos com nossas circunstancias, carregando a bagagem que nos foi dada e a que fomos adquirindo, navegamos.
Escolhemos algo do roteiro, desenhamos alguma coisa nas margens, acompanhados por presenças positivas mas também pelo monstro da nossa dificuldade de viver bem, sempre pronto a liquidar conosco.

Não nos damos sempre conta dele: faz parte da nossa cultura, nossa educação, da mídia, da personalidade. Está nas revistas, na mente dos que nos rodeiam e dos que amamos, está dentro dentro de nós. Cresce e prolifera na medida que não temos o costume de lidar com ele. Somos muitos, dizia o demônio que possuía um infeliz na literatura cristã.
Todas elas nos controlam e inibem: a imposição e aceitação de modelos inatingíveis; a não-apreciação de si; a submissão a preconceitos, a ausência de valores pessoais; a frivolidade nos relacionamentos afetivos mais variados. O conseqüente temor do processo que em lugar de evolução e crescimento nos assusta como aniquilamento.
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Precisamos superar a idéia de que estamos meramente correndo para o nosso fim, num processo de deteriorização e apagamento.
Esse é o nosso fantasma mais destrutivo, pois se alimenta com nosso terror da morte, e cresce desmesuradamente porque nosso vazio interior lhe concede um espaço extraordinário.

Se quisermos, mais que sobreviver, crescer enquanto humanos e pensantes, esse relógio sobre a mesa-de-cabeceira ou no pulso – especialmente o relógio em nossa mente – deve ser apenas aquilo que é: instrumentos para medir e coordenar as atividades humanas. Para marcar as fases com seus encantos e limitações, sua riqueza e suas privações, mas de modo geral, significando crescimento, não mutilação.

A cada transição executamos nossos rituais, perdemos alguns bens e ganhamos outros, alguns duramente conquistados. Falo dos bens de dentro.
Esse que nem o banco fechando nem o país falindo caducam; esses que nem o amado morrendo a gente perde; esses que na dor nos iluminam, na alegria nos ajudam a curtir mais e, no tédio – quando tudo parece tão sem graça – agitam correntes submersas de energia, mesmo se a superfície parece morta.
Lya Luft (Perdas & Ganhos)


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Aceitar a velhice do corpo é superar as limitações da alma e compreender a natureza das coisas.
É sentir-se e ser jovem, mesmo em um corpo “velho”.
(Há muitos “velhos”, apesar do corpo ainda jovem)

Assim como a natureza, nós também temos as “quatro estações”.
Infância, Juventude, Maturidade e Velhice.
Cada uma delas têm a sua importância e beleza no "propósito da criação".
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25.8.06

Criança


Já fui sonho... projeto... feto...
Hoje, sou como o raiar de um novo dia,
O brotar de uma semente,
O desabrochar de uma flor!
Sou como uma doce melodia,
Com autor e partitura,
Só preciso que me "toquem" com ternura,
Para que eu possa ser gente!
Do bem, quero ser sempre contexto,
Não nasci para ser avesso!
Sou portador de sol,
Trago luz,
Alegria e esperança,
Afinal sou criança,
Imagem e semelhança de Jesus!

Walter Pimentel


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Quase



Ainda pior que a convicção do não e a incerteza do talvez é a desilusão de um quase. É o quase que me incomoda, que me entristece, que me mata trazendo tudo que poderia ter sido e não foi.

Quem quase ganhou ainda joga,
quem quase passou ainda estuda,
quem quase morreu está vivo,
quem quase amou não amou.

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Basta pensar nas oportunidades que escaparam pelos dedos, nas chances que se perdem por medo, nas idéias que nunca sairão do papel por essa maldita mania de viver no outono.

Pergunto-me, às vezes, o que nos leva a escolher uma vida morna; ou melhor não me pergunto, contesto. A resposta eu sei de cor, está estampada na distância e frieza dos sorrisos, na frouxidão dos abraços, na indiferença dos "Bom dia", quase que sussurrados.

Sobra covardia e falta coragem até pra ser feliz. A paixão queima, o amor enlouquece, o desejo trai. Talvez esses fossem bons motivos para decidir entre a alegria e a dor, sentir o nada, mas não são.
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Se a virtude estivesse mesmo no meio termo, o mar não teria ondas, os dias seriam nublados e o arco-íris em tons de cinza.

O nada não ilumina, não inspira, não aflige nem acalma, apenas amplia o vazio que cada um traz dentro de si.

Não é que fé mova montanhas, nem que todas as estrelas estejam ao alcance, para as coisas que não podem ser mudadas resta-nos somente paciência porém, preferir a derrota prévia à dúvida da vitória é desperdiçar a oportunidade de merecer.

Para os erros há perdão;
para os fracassos, chance;
para os amores impossíveis, tempo.
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De nada adianta cercar um coração vazio ou economizar a alma. Um romance cujo fim é instantâneo ou indolor não é romance.

Não deixe que a saudade sufoque,
que a rotina acomode,
que o medo o impeça de tentar.
Desconfie do destino e acredite em você.
Gaste mais horas realizando que sonhando,
fazendo que planejando,
vivendo que esperando porque,
embora quem quase morre esteja vivo,
quem quase vive já morreu.
Luis F. Veríssimo

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24.8.06

Olhe o dia amanhecendo



Se as nossas chaves não abriram as portas
que desejávamos, se nossos fracassos ocasionais
nos levaram ao desânimo, é hora de utilizar
as forças da natureza, da qual somos filhos.

Todos os dias, tudo recomeça na natureza e,
a cada amanhecer, surge uma nova chance
para recomeçar um caminho que possa
nos conduzir a destinos melhores.

Por isso, aproveite a folha em branco
que a vida nos dá todos os dias.

Veja, sobretudo, quão maravilhoso
é poder ter na oportunidade do recomeço,
a chance de poder tentar tudo de novo.

Legrand

Confiança

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"Se seus esforços foram vistos com indiferença, não desanime.
Também o sol ao nascer dá um espetáculo todo especial e,
mesmo assim, a maioria da platéia está dormindo."
Edu Francisco
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23.8.06

Cuidar da casa...(E de nós, como cuidamos?)

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Acho que, por ser a limpeza em geral aceita como o que vem imediatamente depois da santidade, as rotinas diárias medem-se por categorias de uma hora e meia de lavagem de pratos, uma hora e meia de lavagem de roupas, toalhas e lençóis, uma hora de limpeza da casa, duas horas de limpeza e preparação de alimentos, uma hora de autolimpeza, externa e interna, entrecortada por uma hora para descansar as costas, tudo isso somando oito horas do dia dedicadas à sujeira de ontem, com o receio de que ela se transforme na imundície de hoje e na doença de amanhã. E em todas essas oito horas dedicadas à limpeza de ontem, nenhum ato construtivo nem ganho na promoção do padrão de vida é realizado.

Acho que é preciso o “sétimo dia”, santificado pelo repouso, e boa dose de pregação, oração e canto de salmos, para manter uma mãe-dona-de-casa de bom humor, enquanto ela progressivamente renuncia ao seu potencial em favor das próximas gerações. *

*Buckminster Fuller, Ideas and Integrities, Collier Books.

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Concordando ou não com o autor,
uma coisa é certa: alguém tem que fazer!
Há outra alternativa?
Penso que não.
O máximo que podemos conseguir é a divisão nos papéis.
A inversão é difícil.

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22.8.06

Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver do Universo...

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VII

Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver do Universo...
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer,
Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não do tamanho da minha altura...

Nas cidades a vida é mais pequena
Que aqui na minha casa no cimo deste outeiro.
Na cidade as grandes casas fecham a vista à chave,
Escondem o horizonte, empurram o nosso olhar para longe de todo o céu,
Tornam-nos pequenos porque nos tiram o que os nossos olhos nos podem dar,
E tornam-nos pobres porque a nossa única riqueza é ver.
Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa)

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Há metafísica bastante em não pensar em nada.

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V
O que penso eu do Mundo?
Sei lá o que penso do Mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que ideia tenho eu das coisas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?
Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das coisas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o Sol
E a pensar muitas coisas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o Sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do Sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
A luz do Sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.

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Imagem: Dennis Flaherty

Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?

«Constituição íntima das coisas»...
«Sentido íntimo do Universo»...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em coisas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.

Pensar no sentido íntimo das coisas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.

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Imagem:James Cook

O único sentido íntimo das coisas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.

Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!

(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as coisas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.

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Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?),
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.

Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa)
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Aprendizado




































































No amor, nem sempre são as faltas o que mais nos prejudica, mas sim a maneira como procedemos depois de as ter cometido. "Oví­dio"